Ecumenismo, o desejo de nosso Senhor Jesus Cristo em sua Oração Sacerdotal
No dia 21 de outubro, celebramos o Dia Nacional do Ecumenismo, uma data que nos convida a refletir sobre o desejo profundo de nosso Senhor Jesus Cristo: que sua Igreja seja uma só, unida em amor e fé. Na oração sacerdotal, registrada no Evangelho segundo a Comunidade Joanina, Ele pede ao Pai: “Que todos sejam um, como Tu, ó Pai, o és em mim, e eu em Ti, para que também eles sejam em nós, e o mundo creia que Tu me enviaste” (Jo 17,21). Essa súplica do próprio Cristo é o coração do ecumenismo. A unidade da Igreja nunca foi pensada como uniformidade rígida, mas como comunhão viva, rica em diversidade de dons e expressões.
A sagrada escritura testemunha que a unidade era uma marca das primeiras comunidades cristãs. O livro dos Atos dos Apóstolos nos mostra que os fiéis perseveravam juntos na doutrina, no partir do pão e nas orações, vivendo em comunhão e partilhando tudo o que possuíam. São Paulo Apóstolo, em suas cartas, insiste na ideia de que há um só Corpo, um só Espírito, uma só fé e um só batismo (cf. Ef 4:4-6). A diversidade, portanto, é legítima e até necessária, mas a divisão é sempre uma ferida no Corpo de Cristo.
A história, entretanto, nos apresenta um cenário marcado por rupturas. No século XI, a Igreja Una, Santa, Católica e Apostólica se dividiu com o Grande Cisma do Oriente, separando a tradição romana da tradição ortodoxa. Mais tarde, no século XVI, a Reforma Protestante, iniciada por Martinho Lutero e aprofundada por outros reformadores como João Calvino, provocou novas fragmentações, dando origem ao luteranismo, ao presbiterianismo, ao anglicanismo, ao metodismo e, mais tarde, aos batistas, aos adventistas e, séculos depois, ao pentecostalismo e ao neopentecostalismo. Hoje, o cristianismo se apresenta em três grandes tradições: o catolicismo romano, o catolicismo ortodoxo e o catolicismo protestante/evangélico em suas múltiplas vertentes.
Essas divisões, embora dolorosas, também revelam a busca sincera de homens e mulheres por uma fé viva, enraizada na Palavra de Deus e adaptada aos diferentes contextos culturais e sociais. Mas o fato é que a fragmentação enfraquece o testemunho do Evangelho diante do mundo. O próprio São Paulo advertia à comunidade de Corinto que não deveria haver divisões, mas que todos deveriam estar unidos num mesmo espírito e num mesmo parecer (cf. 1Co 1,10). A unidade não é uma questão opcional, mas parte integrante da identidade cristã.
O movimento ecumênico surge, então, como resposta a esse chamado. Ele não busca apagar a história nem reconstruir uma única instituição eclesial, mas cultivar a comunhão espiritual entre todos os que professam Jesus Cristo como Senhor e Salvador. Como dizia Santo Agostinho: “Nas coisas essenciais, unidade; nas duvidosas, liberdade; em todas, caridade.” Esse princípio ecoa como fundamento filosófico e teológico do ecumenismo. Não se trata de uniformizar, mas de reconhecer a riqueza da diversidade, vivendo-a como dom e não como barreira.
No plano social, o ecumenismo é igualmente urgente. Num mundo marcado por guerras, fome, injustiças e desigualdades, o testemunho de uma Igreja dividida soa contraditório. Quando diferentes tradições cristãs se unem para defender a dignidade da vida, promover a paz e combater a exclusão, o Evangelho ganha força e credibilidade. O Papa Francisco tem insistido que a credibilidade da mensagem cristã depende da capacidade dos cristãos de viverem como irmãos, superando o escândalo da divisão.
É importante diferenciar o ecumenismo do diálogo inter-religioso. Enquanto o primeiro diz respeito à busca da unidade entre as diversas denominações cristãs, o segundo refere-se ao encontro entre tradições religiosas distintas, como o judaísmo, o islã, o hinduísmo e o budismo. Ambos são importantes, mas o ecumenismo nasce de uma exigência interna do próprio Evangelho, pois a fé cristã só é plenamente testemunhada na comunhão entre os que creem em Cristo.
Claro, ainda há muitos desafios. Há resistências históricas, divergências doutrinais, disputas políticas e até receios de perda de identidade. Mas o verdadeiro ecumenismo não é diluição, e sim encontro. Ele convida cada tradição a reconhecer a obra do Espírito Santo também no outro, a aprender e a crescer na comunhão. Já vemos frutos concretos: orações conjuntas, iniciativas sociais compartilhadas, encontros teológicos e gestos simbólicos de fraternidade que mostram que o caminho é possível.
O Dia Nacional do Ecumenismo, portanto, não deve ser apenas lembrado como uma data no calendário, mas assumido como um convite à conversão pastoral e espiritual. Cada cristão, seja católico, ortodoxo ou protestante, é chamado a viver na prática o pedido de Cristo: que todos sejam um. A unidade começa no cotidiano, na caridade vivida, na capacidade de reconhecer o outro como irmão e de testemunhar, juntos, o amor de Deus.
Que esta data nos inspire a viver um cristianismo que não se limita às fronteiras das denominações, mas que se reconhece como Corpo Místico de Cristo. Que possamos, enfim, dar ao mundo o testemunho de que, apesar das diferenças, todos somos discípulos do mesmo Senhor. Pois está escrito: “Nisto conhecerão todos que sois meus discípulos: se tiverdes amor uns aos outros” (Jo 13,35).
Alexandre Dettmann Kurth está cursando Licenciatura em Matemática (97,86% concluída) pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Espírito Santo (Ifes); é professor de Matemática e Física pela Secretaria de Estado da Educação do Espírito Santo (Sedu/ES); cristão de tendência católica apostólica evangélica, membro leigo da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil (IEAB), buscando o diálogo ecumênico com as outras denominações cristãs e o diálogo inter-religioso com as outras religiões, principalmente o hinduísmo, o budismo, o taoísmo e as de matrizes africanas.
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