Virgem Maria: Mãe de Cristo ou Mãe de Deus? – Os conflitos em relação ao dogma da maternidade divina

 


Em primeiro de janeiro, a Igreja Católica Apostólica Romana celebra o Dia de Santa Maria, Mãe de Deus – um título muito controverso em grande parte do protestantismo e evangelicalismo contemporâneo. Porém, essa controvérsia não se originou com a ascensão da Reforma Protestante e do Movimento Evangélico (o próprio Martim Lutero acreditava nesse dogma, o dogma da maternidade divina): suas raízes encontram-se na Igreja Primitiva.

 

Uma das principais controvérsias, talvez a principal, do Cristianismo Primitivo foi em relação à divindade de Jesus Cristo: se Ele é Filho de Deus, gerado da substância do Pai, assim também sendo Deus, ou se Ele é Filho de Deus, criado pelo Pai de uma natureza distinta, assim sendo uma criatura. No Concílio realizado na cidade de Nicéia, é institucionalizada a divindade do Filho Unigênito de Deus, sendo Deus gerado da substância do Pai antes de todos os séculos; e, no Concílio realizado na cidade de Constantinopla, algumas décadas depois, é institucionalizada a divindade do Espírito Santo, sendo uma pessoa divina distinta do Pai e do Filho, que procede do Pai (na época, não havia a questão de Filioque) e com Pai e o Filho é adorado e glorificado.

 

Porém, se Jesus é Deus, como sua natureza divina se relaciona com sua natureza humana? Afinal, Ele é o Logos Eterno de Deus encarnado. Três grandes visões cristológicas surgiram a esse respeito: uma liderada por Nestório de Constantinopla, que defendia que Cristo Jesus e o Logos Eterno são duas pessoas distintas; outra liderada por Cirilo de Alexandria, que defendia que Cristo Jesus e o Logos Eterno são uma única e perfeita pessoa dotada de duas naturezas distintas – humana e divina respectivamente; e outra liderada por Eitiquis, que defendia que Logos Eterno absorveu a natureza humana de Jesus Cristo, sendo Ele apenas uma pessoa divina.

 

Para resolver essas controvérsias, foram realizados dois Concílios: o primeiro na cidade de Éfeso, que combateu as ideias de Nestório, e o segundo na cidade de Calcedônia, que combateu as ideia de Eitiquis. Com isso, institucionalizando a doutrina cristológica da união hispostática, defendida por Cirilo de Alexandria. Jesus é verdadeiro em sua natureza divina, sendo consubstancial ao Pai e ao Espírito Santo, e verdadeiro em sua natureza humana, sendo consubstancial a nós. Uma das consequências dessa doutrina foi o dogma da maternidade divina: se Maria é mãe de Jesus e Jesus é uma única e perfeita pessoa de naturezas humana e divina, isto é, o Logos Eterno de Deus encarnado. Logo, Maria é Theótokos, Portadora de Deus ou Mãe de Deus.


REFERÊNCIAS:

CAMPOS, Ludimila Calima. Entre Christótokos e Theótokos: a construção da figura de Maria em Nestório de Constantinopla e Cirilo de Alexandria (séc. IV-V). Revista de História da USP, n. 174, p. 261-380, jan.-jun., 2016.

Concilios de Éfeso e Calcedonia. Instituto São Paulo de Estudos Superiores. Disponível em https://pt.scribd.com/document/388479958/Concilio-de-Efeso-e-Calcedonia. Acesso em 01 de janeiro de 2022.


Por Alexandre Dettmann Kurth, graduando em Licenciatura em Matemática pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Espírito Santo (Ifes). Cristão católico apostólico evangélico episcopal anglicano entusiasta da Filosofia, da Teologia e das Ciências das Religiões e simpatizante de religiões asiáticas, como o Sanatana Dharma, o Buddha Dharma e o Taoísmo.

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